A crise climática deixou de ser uma previsão distante para se tornar uma realidade urgente e palpável, cujos efeitos são sentidos de forma cada vez mais intensa em todo o mundo. No Brasil, um país de dimensões continentais e vasta sociobiodiversidade, os impactos das mudanças climáticas – como eventos extremos, secas prolongadas, inundações devastadoras e o aumento do nível do mar – não são apenas ambientais, mas profundamente sociais. Nesse contexto, emerge o conceito de justiça climática, que reconhece que os ônus da crise climática recaem desproporcionalmente sobre os grupos e comunidades mais vulnerabilizados, aqueles que historicamente menos contribuíram para o problema. Para o Serviço Social brasileiro, a pauta da justiça climática se impõe como um campo de reflexão e atuação inadiável.
O Serviço Social e os efeitos das mudanças climáticas
A Crise Climática como Questão Social Urgente
É fundamental compreender que a crise climática transcende a dimensão puramente ambiental. Ela é, em sua essência, uma crise social que aprofunda desigualdades preexistentes e cria novas formas de vulnerabilidade. O fenômeno do racismo ambiental evidencia como comunidades negras, indígenas, quilombolas e periféricas urbanas são frequentemente as mais expostas aos riscos ambientais, como a proximidade de lixões, a contaminação de rios, a falta de saneamento básico e os impactos de desastres, e, ao mesmo tempo, as que possuem menor capacidade de resposta e adaptação devido à exclusão socioeconômica e à negação histórica de direitos. O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) já denunciou a “destruição ambiental promovida pelo capitalismo, que ameaça biomas, expulsa comunidades de seus territórios e compromete o futuro do planeta“. Esta análise crítica conecta as causas estruturais da degradação ambiental às suas consequências diretas na vida das populações.
O Posicionamento e o Chamado Ético-Político do Serviço Social
O Serviço Social brasileiro, pautado em seu projeto ético-político, tem o imperativo de se posicionar ativamente frente à emergência climática. O próprio Conjunto CFESS-CRESS, em seu 51º Encontro Nacional, realizado em setembro de 2024 em Belo Horizonte, aprovou como tema para o Dia da e do Assistente Social 2025: “Serviço Social na luta por justiça ambiental para a diversidade de povos e biomas”, além de deliberar sobre a elaboração de estudos para possível isenção de anuidade para profissionais afetados por catástrofes.
Em 2025, o CFESS reafirmou este compromisso com o slogan “A gente defende a justiça ambiental para combater a desigualdade social!”, convocando assistentes sociais a integrarem a dimensão socioambiental em suas análises e intervenções. A discussão sobre “MEIO AMBIENTE, TERRITÓRIOS E SERVIÇO SOCIAL” como “CAMINHOS NECESSÁRIOS À LUTA ANTICAPITALISTA” foi publicada na Revista SER Social em Perspectiva em abril de 2025, indicando um aprofundamento teórico necessário sobre a temática
Impactos Diretos nas Populações Acompanhadas pelo Serviço Social

As mudanças climáticas afetam diretamente as condições de vida das populações atendidas pelo Serviço Social. A perda de moradias devido a enchentes ou deslizamentos, a insegurança alimentar decorrente de secas que comprometem a agricultura familiar, o agravamento de problemas de saúde devido à poluição ou a vetores de doenças que se expandem com o aquecimento global, e a perda de meios de subsistência são apenas alguns exemplos. O relatório da Anistia Internacional Brasil, de maio de 2025, que aponta falhas no enfrentamento às mudanças climáticas, vincula essa omissão a violações de direitos humanos, uma perspectiva central para a atuação do assistente social.
Atuação Prática do Assistente Social na Promoção da Justiça Climática
O engajamento do assistente social na pauta da justiça climática pode se materializar de diversas formas:
Eixo de Atuação | Descrição |
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Trabalho Social com Grupos e Comunidades | Fortalecer a organização comunitária para a identificação de riscos socioambientais, a elaboração de planos de adaptação e a reivindicação de políticas públicas. |
Advocacy e Defesa de Direitos | Atuar na defesa de políticas públicas que promovam a justiça climática, como regularização fundiária, saneamento básico, moradia segura em áreas não suscetíveis a riscos, e transição para energias limpas e agricultura sustentável. |
Participação em Conselhos e Fóruns | Integrar espaços de controle social e formulação de políticas socioambientais. |
Intervenção em Situações de Desastres Socioambientais | Realizar o atendimento a famílias atingidas, garantindo o acesso a direitos, benefícios e serviços, com uma abordagem que considere os traumas e as necessidades específicas no pós-desastre, sempre sob a ótica dos direitos humanos. |
Educação Popular e Ambiental Crítica | Promover o debate sobre as causas e consequências da crise climática e a importância da organização popular para a transformação social. |
Desafios e Perspectivas para o Futuro
Reconhecer a importância da pauta não exime a profissão de enfrentar desafios, como a necessidade de maior investimento em formação específica sobre as intersecções entre questão social e ambiental, a superação de resistências institucionais para integrar a dimensão climática nas políticas sociais e a construção de metodologias de intervenção adequadas a essa nova realidade. Contudo, as perspectivas são de fortalecimento do papel do Serviço Social como um ator fundamental na construção de alternativas mais justas e sustentáveis.
Um Chamado à Ação Coletiva
A justiça climática não é apenas uma questão ambiental, mas uma dimensão indissociável da luta por direitos e por uma sociedade mais justa e igualitária. O Serviço Social brasileiro, com seu acúmulo histórico e seu compromisso ético-político, é convocado a estar na linha de frente dessa luta, defendendo os territórios, os modos de vida e os direitos das populações mais vulnerabilizadas pela crise climática. É um chamado à reflexão crítica, à inovação nas práticas e à ação coletiva.

Professor universitário. Doutorando em Políticas Públicas. Mestre em Sociologia. Especialista em Gestão Pública Municipal. Especialista em Direito Previdenciário. Bacharel em Serviço Social e em Administração.
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5220780303947208
ResearchGate: https://www.researchgate.net/profile/Francisco-Garcez