A atuação do assistente social no Brasil vai muito além de tarefas burocráticas. Essa é uma profissão profundamente comprometida com os direitos humanos, a justiça social e a transformação das realidades marcadas por desigualdade, pobreza e violações de direitos.
Presentes em diversos espaços institucionais e territórios, os assistentes sociais atuam diretamente no enfrentamento das expressões da chamada questão social, contribuindo de forma estratégica para garantir dignidade e acesso a direitos à população.
Neste artigo, você vai conhecer os principais espaços de trabalho da profissão (espaços sócio-ocupacionais), suas atribuições, desafios e a relevância de sua atuação na garantia de direitos no Brasil contemporâneo.
O Que São Espaços Sócio-Ocupacionais?
Quando falamos em espaços sócio-ocupacionais, não nos referimos apenas ao “lugar físico” onde o assistente social trabalha. Esse conceito envolve todo o conjunto de relações sociais, institucionais, políticas e culturais que moldam o exercício da profissão.
Esses espaços são influenciados por fatores como:
- Condições e vínculos de trabalho;
- Demandas e limites institucionais;
- Disputas ideológicas;
- Expectativas da sociedade e do Estado.
Ou seja, o assistente social atua em ambientes em constante tensão, onde diferentes projetos de sociedade estão em disputa — o que exige posicionamento crítico, ética e resistência.
Os Principais Campos de Atuação do Assistente Social
1. Assistência Social: CRAS e CREAS

A Assistência Social é um dos principais campos de atuação do/a assistente social no Brasil. Sob a estrutura do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), esses profissionais atuam desde o atendimento direto às famílias até a formulação e gestão de políticas públicas.
- Nos CRAS (Centros de Referência de Assistência Social): Realizam ações de proteção básica, com foco na prevenção de riscos sociais, fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, além de articulação com a rede de serviços locais.
- Nos CREAS (Centros de Referência Especializado): Lidam com situações mais complexas, como violência doméstica, exploração sexual, violação de direitos de crianças, idosos e pessoas com deficiência, bem como o acompanhamento de medidas socioeducativas.
- Na gestão pública municipal, estadual e federal: Assistentes sociais também atuam na elaboração, implementação e avaliação de políticas públicas, participando da construção dos planos municipais e estaduais de assistência social, do controle social e da coordenação de serviços e programas.
- Em abrigos, casas de acolhimento e centros POP: Realizam acompanhamento social de pessoas em situação de rua, crianças e adolescentes afastados da família, migrantes e refugiados, entre outros grupos em vulnerabilidade.
- Na articulação com outras políticas públicas: Sua atuação é essencial para garantir que os usuários tenham acesso a direitos em áreas como saúde, educação, habitação e justiça.
Essa diversidade mostra que o campo da assistência social não é apenas o maior empregador da categoria, mas também um dos mais complexos e estratégicos para o enfrentamento das desigualdades no Brasil.
Assistência Social, Serviço Social, Assistente Social e Assistencialismo.
2. Saúde

O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos pilares das políticas públicas brasileiras, e a presença do/a assistente social é fundamental para garantir que esse sistema funcione de forma humanizada, inclusiva e com foco nos direitos dos usuários.
A atuação ocorre em diversos níveis:
- Atenção Básica (postos e unidades de saúde da família): O/a assistente social identifica demandas sociais do território, acompanha famílias em situação de vulnerabilidade, orienta sobre acesso a benefícios e serviços e fortalece a articulação entre saúde, assistência social, educação e justiça.
- Hospitais e unidades de média e alta complexidade: Atua no acolhimento de pacientes e familiares, viabiliza acesso a tratamentos, medicações e benefícios, e acompanha situações como alta complexa, abandono hospitalar e desproteção social.
- Saúde Mental: Nos CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), residências terapêuticas e hospitais psiquiátricos, contribui com o processo de desinstitucionalização, inclusão social, fortalecimento de redes de apoio e construção de projetos de vida com os usuários.
- Gestão e planejamento: Muitos assistentes sociais atuam em secretarias de saúde, coordenando programas, produzindo diagnósticos territoriais, elaborando políticas públicas e articulando redes intersetoriais para enfrentamento das desigualdades em saúde.
- Controle social: Participam de conselhos municipais, estaduais e nacional de saúde, contribuindo com o debate sobre financiamento do SUS, prioridades locais e a defesa da saúde como direito universal e não mercadoria.
- Emergências sanitárias: A pandemia de COVID-19 evidenciou o papel essencial do serviço social na linha de frente, tanto no acolhimento direto às famílias enlutadas quanto na formulação de estratégias de enfrentamento das desigualdades escancaradas pela crise sanitária.
3. Previdência Social

Na Previdência Social, especialmente no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o trabalho do/a assistente social é estratégico para garantir o acesso da população a benefícios fundamentais e, mais do que isso, para traduzir direitos em realidades vividas pelas pessoas.
- Avaliação Social para o BPC (Benefício de Prestação Continuada): O/a assistente social realiza estudos sociais que analisam as condições de vida de idosos e pessoas com deficiência em situação de extrema vulnerabilidade, sendo decisivo/a na concessão desse benefício assistencial.
- Orientação e educação previdenciária: Informa a população sobre direitos previdenciários, como aposentadorias, pensões, auxílio-doença e salário-maternidade, especialmente em comunidades com pouco acesso à informação ou à internet.
- Atendimento humanizado: Em um ambiente muitas vezes marcado pela lógica burocrática, o/a assistente social é responsável por promover escuta qualificada, acolher situações de exclusão e encaminhar demandas sociais que vão além da esfera previdenciária.
- Articulação com outras políticas públicas: Identifica demandas que exigem ações intersetoriais com saúde, assistência social, habitação, justiça ou educação, visando o enfrentamento de múltiplas vulnerabilidades que afetam os usuários da Previdência.
- Desafios da digitalização (INSS Digital): A crescente automatização dos serviços tem gerado exclusão digital de milhões de pessoas. O/a assistente social atua como ponte entre o cidadão e o sistema, lutando para que ninguém fique de fora por falta de acesso tecnológico.
- Participação na gestão pública: Além da linha de frente, muitos profissionais atuam na formulação de políticas públicas e na análise de dados sociais que orientam a construção de programas voltados à seguridade social.
Essa atuação reafirma o papel do/a assistente social como garantidor/a de direitos em um contexto onde a burocracia, o desmonte da seguridade e as desigualdades sociais impõem barreiras à proteção social no Brasil.
4. Campo Sociojurídico

A atuação do/a assistente social no campo sociojurídico ocorre em um espaço de fortes tensões: de um lado, as demandas técnicas do sistema de justiça; de outro, a defesa incondicional dos direitos humanos, da dignidade e da não discriminação. Trata-se de um campo onde o compromisso ético-político da profissão é diariamente colocado à prova.
- Tribunais, Ministérios Públicos e Defensorias Públicas: O/a profissional elabora laudos, pareceres sociais, estudos de caso e presta assessoria técnica em processos judiciais que envolvem guarda, adoção, medida protetiva, interdição, reconhecimento de vínculos familiares, entre outros.
- Sistema prisional e medidas socioeducativas: Atua junto a pessoas privadas de liberdade e adolescentes em conflito com a lei, realizando escuta qualificada, articulação com políticas públicas e acompanhamento familiar. O desafio constante é romper com a lógica punitivista e contribuir com processos de responsabilização que respeitem os direitos e a dignidade.
- Varas da infância, juventude, família e idoso: O/a assistente social contribui com diagnósticos sociais que subsidiam decisões judiciais em situações de violência, negligência, abandono ou vulnerabilidade social, com foco na proteção integral e no fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.
- Mediação de conflitos e justiça restaurativa: Em algumas comarcas, participa de experiências inovadoras de escuta ativa e resolução de conflitos extrajudiciais, fortalecendo a cultura de paz e a construção coletiva de soluções.
- Defesa da população em situação de rua, mulheres em situação de violência, migrantes, usuários/as de substâncias psicoativas: O trabalho não se limita ao processo jurídico, mas se amplia para a articulação de redes de apoio, garantia de acesso a serviços e enfrentamento de estigmas.
- Tensões éticas: É um campo onde o/a assistente social precisa constantemente afirmar sua autonomia técnica e ética, resistindo a pressões que tentam reduzir sua atuação à mera produção de documentos ou à confirmação de decisões previamente tomadas.
Esse campo exige firmeza teórica, sensibilidade social e posicionamento crítico, pois o que está em jogo não é apenas um processo legal, mas a vida e os direitos de pessoas em contextos de profunda desigualdade.
Perícia Social e Serviço Social: Dra. Graça Türck esclarece dúvidas – Portal do Serviço Social
5. Educação

A educação é um direito social fundamental, e o serviço social tem papel essencial na garantia do acesso, permanência e sucesso escolar de crianças, adolescentes, jovens e adultos, especialmente aqueles que vivem em contextos de vulnerabilidade.
Desde a promulgação da Lei nº 13.935/2019, os sistemas públicos de ensino têm incorporado assistentes sociais em suas equipes multiprofissionais. Sua atuação, porém, vai muito além do que se costuma imaginar.
- Prevenção e enfrentamento da evasão e abandono escolar: Investiga os motivos que levam estudantes a se afastarem da escola, articula respostas intersetoriais e acompanha famílias em situação de vulnerabilidade, fortalecendo vínculos com a comunidade escolar.
- Acolhimento e mediação de conflitos: Atua em situações de violência doméstica, bullying, preconceito, racismo, luto e abuso sexual, contribuindo para a construção de um ambiente escolar mais seguro, inclusivo e acolhedor.
- Articulação com políticas públicas: Atua como ponte entre a escola e os serviços de saúde, assistência social, justiça e cultura, garantindo o acesso dos estudantes e suas famílias aos direitos sociais de forma integral.
- Planejamento institucional e assessoria à gestão escolar: Contribui com diagnósticos sociais, leitura crítica do território, construção de protocolos e ações de prevenção voltadas ao público escolar.
- Educação inclusiva e diversidade: Apoia o atendimento de estudantes com deficiência, neurodivergentes, em situação de refúgio ou pertencentes a comunidades tradicionais, respeitando suas singularidades e promovendo o direito à diferença.
- Formação e sensibilização da comunidade escolar: Realiza rodas de conversa, palestras e oficinas com estudantes, professores, gestores e famílias sobre direitos, cidadania, convivência e enfrentamento das desigualdades estruturais.
A presença do/a assistente social na educação fortalece a visão crítica do processo educativo, ampliando o olhar sobre os determinantes sociais que interferem na trajetória escolar. Seu trabalho não é pedagógico no sentido tradicional, mas é profundamente educativo, ao promover valores de justiça social, respeito e equidade dentro e fora da escola.
6. Empresas Privadas
A presença do/a assistente social em empresas privadas ainda é marcada por ambiguidades. Inserido em instituições voltadas para o lucro, o/a profissional precisa constantemente afirmar seu compromisso com a ética, a justiça social e os direitos da classe trabalhadora, mesmo em ambientes que, muitas vezes, tentam neutralizar ou despolitizar sua atuação.
- Saúde ocupacional e qualidade de vida: Atua na prevenção de adoecimentos físicos e emocionais relacionados ao trabalho, desenvolvendo ações educativas, escuta qualificada e mediação de demandas junto às equipes de recursos humanos e segurança do trabalho.
- Acompanhamento de casos sociais complexos: Realiza intervenções em situações como alcoolismo, violência doméstica, dificuldades financeiras, luto, dependência química, discriminação e conflitos familiares, buscando garantir o suporte necessário aos trabalhadores e seus núcleos familiares.
- Ações de promoção da diversidade e enfrentamento das desigualdades: Participa da construção de políticas internas que valorizem a equidade racial, de gênero, etária e sexual no ambiente corporativo, além de combater práticas discriminatórias.
- Responsabilidade social empresarial (RSE): Contribui com o planejamento e execução de projetos sociais da empresa, garantindo que essas ações não se limitem ao marketing institucional, mas estejam realmente alinhadas à defesa de direitos e à transformação social.
- Mediação de conflitos trabalhistas: Atua como interlocutor/a entre trabalhadores e empregadores em situações de afastamento, readaptação ou desligamento, promovendo alternativas que respeitem os direitos humanos e legais.
- Ética profissional frente à lógica do lucro: O maior desafio é manter a autonomia e a perspectiva crítica, sem ser capturado por interesses meramente produtivistas, utilitaristas ou simbólicos (como o uso do trabalho social para “limpar a imagem” de empresas com práticas precarizantes).
Nesse espaço, o/a assistente social é muitas vezes o único/a profissional com uma formação voltada para os direitos sociais, o que reforça sua importância na construção de ambientes de trabalho mais justos, saudáveis e humanizados.
7. Terceiro Setor: ONGs e Movimentos Sociais
O campo do terceiro setor reúne uma ampla variedade de instituições da sociedade civil, que atuam tanto na formulação quanto na execução de ações sociais, culturais, ambientais e de direitos humanos. Nele, o serviço social se insere de forma estratégica, mas também enfrenta contradições significativas. As duas principais frentes de atuação nesse espaço são as organizações da sociedade civil (OSCs) e os movimentos sociais populares.
8. Organizações da Sociedade Civil (OSCs)
As OSCs exercem papel relevante na promoção de direitos, especialmente em territórios onde a presença do Estado é limitada ou insuficiente. Nestes contextos, o/a assistente social pode atuar em:
- Gestão e desenvolvimento de projetos sociais, com foco em inclusão, proteção de grupos vulnerabilizados e fortalecimento da cidadania;
- Capacitação de equipes, formação de lideranças comunitárias e articulação em redes de proteção social;
- Monitoramento e avaliação de impacto social, buscando alinhar os projetos às diretrizes éticas e políticas do serviço social.
No entanto, muitas OSCs operam sob lógicas assistencialistas, filantrópicas ou até mercadológicas, convertendo ações sociais em estratégias de marketing institucional ou captação de recursos. Diante disso, cabe ao/à assistente social exercer criticamente sua atuação, defendendo uma prática voltada à emancipação social — e não à manutenção das desigualdades.
9. Movimentos Sociais Populares
Nos movimentos sociais organizados — de moradia, juventude, mulheres, populações negras e indígenas, LGBTQIA+, trabalhadoras/es rurais e urbanos, entre outros — o/a assistente social atua como parceiro/a político/a da luta por direitos. Nesse campo, sua atuação envolve:
- Assessoria técnica e formação política de base, com produção de laudos, diagnósticos e pareceres sociais em apoio às reivindicações coletivas;
- Fortalecimento da organização comunitária e da ação coletiva, contribuindo para a construção de agendas públicas a partir das demandas populares;
- Participação em incidências políticas, audiências públicas, conselhos de direitos e articulações intersetoriais.
Ao lado dos movimentos sociais, o serviço social encontra uma de suas expressões mais potentes: a prática que resiste, denuncia e propõe. Uma atuação que não se limita à institucionalidade, mas se coloca como instrumento da transformação social.
10. Consultoria, Assessoria, Docência e Pesquisa
Além da atuação direta nos diversos campos socioocupacionais, muitos assistentes sociais desenvolvem sua carreira em espaços voltados à produção e disseminação do conhecimento crítico, ao suporte técnico e à formação de novas gerações de profissionais.
- Consultoria e assessoria técnica: Prestam apoio especializado a órgãos públicos, organizações da sociedade civil, movimentos sociais e instituições privadas, orientando sobre a formulação, implementação e avaliação de políticas públicas e projetos sociais. Essa atuação exige um olhar estratégico, técnico e político para fortalecer a efetividade das ações sociais e garantir o respeito aos direitos humanos.
- Docência: Em instituições de ensino superior, contribuem para a formação acadêmica e política dos futuros assistentes sociais, promovendo o debate crítico, a reflexão ética e a aproximação entre teoria e prática. Essa função é essencial para a renovação e o aprofundamento do Projeto Ético-Político da profissão.
- Pesquisa: Desenvolvem estudos que investigam questões sociais contemporâneas, desafios profissionais, impactos de políticas públicas e contribuem para a produção científica que subsidia a prática profissional e o avanço do conhecimento no campo do serviço social.
- Extensão universitária e educação popular: Realizam ações educativas voltadas à comunidade, fortalecendo processos de mobilização social, conscientização de direitos e protagonismo popular.
Essa dimensão da profissão é fundamental para garantir que o serviço social continue evoluindo, incorporando novos saberes e enfrentando de forma crítica as mudanças sociais e políticas do país.
Desafios Transversais da Profissão
A atuação profissional do/a assistente social enfrenta desafios estruturais significativos, como a precarização do trabalho, expressa em contratos temporários, ausência de concursos públicos e salários defasados, o que reforça a urgência da luta por um Piso Nacional digno (PL 1827/2019). Soma-se a isso o adoecimento profissional, intensificado pela sobrecarga emocional e estrutural, especialmente durante a pandemia de COVID-19, evidenciando a necessidade de tratar a saúde do/a trabalhador/a como uma pauta coletiva (Dal Rosso, 2008). Além disso, a crescente automação e a “dataficação do social” têm limitado a dimensão crítica da atuação, excluindo populações sem acesso digital e precarizando ainda mais o trabalho. Por fim, a intersetorialidade das políticas públicas — que exige articulação entre áreas como saúde, assistência, educação e justiça, impõe ao/à assistente social um papel estratégico, embora enfrentado por barreiras institucionais que dificultam a mediação efetiva.
Não devemos esquecer que o serviço social no Brasil é uma profissão marcada por tensões e disputas. Inserido nas contradições da sociedade capitalista, o/a assistente social atua entre o controle social e a transformação social.
Assumir o Projeto Ético-Político como norte é mais do que um dever profissional, é um ato de resistência coletiva e emancipatória.
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Professor universitário. Doutorando em Políticas Públicas. Mestre em Sociologia. Especialista em Gestão Pública Municipal. Especialista em Direito Previdenciário. Bacharel em Serviço Social e em Administração.
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5220780303947208
ResearchGate: https://www.researchgate.net/profile/Francisco-Garcez